domingo, 30 de janeiro de 2011

Almoço



Ela não ia largá-lo. As coxas se esforçavam para manter a circulação. Chave nos pés. Ele tinha ânsia de vômito quando confundia o barulho da cama com o ruído da porta. Se ela o soltasse, seria capaz de fugir.

“Ai, ai”, ela gritava. Sem pudor. As pálpebras espremiam um resquício de lágrima. O lábio inferior trepidava. Sentia-se um rei, cravando sua espada até sangrar as entranhas da inimiga. Ela apertava mais as pernas; enlaçava-o. A mão dele espremia aquelas ancas negras, largas e fortes.

Estava quente, abafado. O quarto minúsculo e sem janela, escuro. Não acenderam a luz pela pressa. E também, ninguém desconfiaria de um quarto apagado. A não ser, é claro, pelos gritos. Agudos. Logo abafados pela mão dele.

Ela tentava se virar. Ele insistia na mesma posição. Um rei. Na cabeceira. Em seu banquete real.
Ela mordia, babava os dedos dele. Um pingo de suor. Um pingo salgado de suor dele escorria na cintura dela. Alguns pelos desgarrados colavam-se nos seios, na barriga e sobre o umbigo dela. A nuca morena impregnava o cheiro de bafo dele.

A cama gemia e ele pensava que não haveria problema. Que, como sempre, tudo iria ocorrer bem. Sorria; gostava quando ela mordia sua orelha.

A “patroa” não era de almoçar em casa. Ele, ao contrário, tinha a vantagem de trabalhar por perto. Desde que começou na firma, costumava passar sempre em casa; mesmo que só para tomar um banho rápido.
Era um sádico, pensava. E imaginava que ela, com as unhas a arranhar suas costas, sentia o mesmo.

Para não gozar rápido, visualizava as crianças: o mais velho brincando de boneco. Depois de mais um ou dois movimentos, tentava lembrar de algumas ocupações no trabalho. Por último, lembrava do dia do seu casamento.

A mulher já não falava de outra coisa além do trabalho. Vivia fora, voltava tarde. Era excessivamente promovida. Nos dias em que comemoravam no quarto – luz de velas, ar condicionado, perfume, lingerie –, não conseguia pensar em outra coisa se não nos meios que a mulher utilizava para subir de cargo. Ela devia, sim, dar satisfações particulares ao chefe da empresa.

As pernas negras voltavam a lhe torcer.

Depois tomaria um banho sozinho. Ela passaria suas roupas. De toalha, ia acabando o almoço em silêncio. A comida deliciosa. Merece um aumento, pensava alto. As notícias falavam de jovens se prostituindo aos 15, 14 anos. Ele desligava a TV e fechava os olhos; rogando a Deus para que isso não pudesse acontecer com a caçula.